Finalmente, 17h e 30min, fim de expediente, se a chuva não tivesse parado eu iria treinar assim mesmo, seria a segunda vez que eu faria os 9km que separam o meu local de trabalho em Sorocaba da minha casa em Votorantim, invés de chuva, um lindo por do sol de mês de julho, com suas características fantásticas de inverno, aquele por do sol que deixa as baixas nuvens com cor de paixão e nos dizem, “ -pare um pouquinho, me aprecie”.
Começo a correr com calma para aquecer, até porque os primeiros 1000m são somente subida, e muito acidentado, por isso não é bom forçar com o corpo frio, superada a subida começo a forçar mais, seguindo pela Rodovia Raposo Tavares, nesse ponto do trajeto posso observar como é o senso de humor da mãe natureza e confesso que achei meio estranho. Na cidade de Votorantim, do outro lado da colina, 8 km a frente, bem onde fica a minha casa e conseqüentemente o meu destino, o céu está tenebrosamente escuro, aquele mau tempo pareceu uma ameaça para o meu treino, pois toda tempestade nessa região segue de sudoeste para nordeste, bem no sentido contrário ao meu.
Refleti sobre a possibilidade de retornar, mas o meu espírito de Prefontaine(http://pt.wikipedia.org/wiki/Steve_Prefontaine) me deixou cego, “vambora” , algo me disse que eu tinha que seguir, a sede de aventura era muito grande.
A medida que os meus parceiros de corrida (par de tênis) devoravam os metros e os quilômetros a chuva se aproximava, já dava para sentir uma garoa fina caindo desordenadamente , bem tímida e insignificante, era um sinal inverso do extremo que eu enfrentaria mais adiante.
No meio do trajeto a garoa já demonstrava querer castigar, mas por enquanto só molhava, estava fazendo só “cosquinha”, mesmo assim eu precisava usar os óculos de segurança. Até agora eu acreditava que o temporal absurdo iria me pegar só de raspão, porém a mãe natureza não aceita que façam pouco caso dela, foi quando iniciou a precipitação de raios e relâmpagos dentro daquela massa cinzenta que se aproximava, um festival fantástico e maravilhoso de ser observado quando se está em um lugar seguro. A escuridão adiante era admirável, parecia que Votorantim não existia mais, como se a tempestade tivesse engolido a cidade e não existisse mais nada além.
Com tudo isso as minhas veias estavam tomadas de adrenalina, meu sangue estava fluorescente e ao invés de pensar em procurar um abrigo eu queria mesmo era chegar logo no meu destino e encarar logo aquilo tudo, “força garoto!”, eu escutava.
No sétimo quilômetro, a algum tempo, a chuva já estava muito forte, eu estava correndo por uma avenida que segue pelo topo da colina oeste de Votorantim, eu me aproximava ao centro da tempestade, a ventania ficava cada vez mais forte, pulverizando a chuva jateando-a de todas as direções no meu rosto, era impossível respirar pelo nariz e respirando pela boca eu quase me afogava com o ar misturado com água que eu aspirava, por isso passei a correr com a mão sobre a boca formando um filtro.
Estava impossível enxergar com os óculos, mas não dava para correr sem eles, a chuva lançada pela força do vento contra o meu rosto machucava os olhos e eu olhava por baixo dos óculos visualizando somente os meus pés para poder enxergar onde eu pisava.
Mesmo nessa situação eu nem imaginava em parar de correr, eu estava tomado por uma força que me permitia superar qualquer obstáculo, o meu psicológico estava no seu extremo, eu até me divertia com cada dificuldade que eu encontrava e rapidamente eu me adaptava para supere-la, a mãe natureza mandava eu matava no peito e chutava pro gol de bicicleta, ela não estava contra mim e sim era minha parceira que fazia os “cruzamentos” mais alucinantes para eu poder marcar o gol da decisão.
Tentei apresar o passo, aumentei a velocidade alonguei as passadas e senti a tremenda força do vento carregando o meu corpo para o lado nos momentos em que os meus pés não tocavam no chão, com uma adaptação no modo de correr consegui manter a velocidade razoável sem me arriscar a levar um tombo.
Eu olhava para a rua e através das lentes embaçadas dos óculos pude ver os clarões dos carros freando porque não conseguiam ver nada, muitos buzinavam, desviavam de outros, o transito virou um caos por muito pouco não houveram acidentes, nesse instante veio em mim algo que não posso explicar mas era como uma energia que me tivesse envolvido e me tornasse imune a qualquer mal, era o sentimento de estar em uma cápsula que me tornava isento dos perigos, estava me "DANDO BARATO", isso me fez pensar, “como o ser humano se faz de frágil, todo aquele desespero que uma situação como essa pode causar nas pessoas e na verdade o único prejuízo que terei é chega em casa molhado”. Realmente, logo eu estava em casa me sentindo um super-man, invulnerável, eu estava realizado mais do que quando corri minha primeira prova, o sentimento durou dias, e passei a me conhecer melhor.
Tudo bem, além de chegar molhado, acredito que as pessoas que me viram correndo devem ter pensado que sou louco, exibido, sem noção..., mas não vou tentar explicar e nem conseguiria explicar o porquê de ter encarado aquilo tudo e porque me senti muito bem depois de tudo, só quem corre pode entender do que estou falando, por isso convido a todos que durante a leitura dessa aventura pensaram, “louco, exibido...”, a correr experimentar essa aventura, não precisa ser na chuva, pode ser num ambiente perfeito para a pratica desse esporte, e fique tranqüilo, ela está a espreita, um dia a mãe natureza vai te encontrar e te convidar para uma aventura alucinante ai você descobrirá o super-homem que existe dentro de você.
Abraços e “Força!”.
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